Em decisão do Tribunal de Justiça do Estado do Espírito Santo (TJES) foi determinada a aplicação do Código de Defesa do Consumidor e a inversão do ônus da prova no caso de um atingido pelo desastre ambiental do Rio Doce, no último dia (06) de fevereiro deste ano. Trata-se de uma das 157 ações ajuizadas pelo Grupo SOS Rio Doce no início dos trabalhos da Defensoria Pública no âmbito do rompimento da barragem da Samarco, em Mariana, Minas Gerais.
O TJES negou provimento ao recurso de instrumento interposto pela empresa Samarco, confirmando a decisão da 1ª Vara Cível de Linhares, entendimento que tem sido aplicado em casos similares. Atualmente, o acompanhamento das ações é feito pelo Núcleo de Defesa Agrária e Moradia, da DPES, e o acompanhamento em segunda instância é feito pelo Núcleo dos Tribunais.
De acordo com o Desembargador Relator Ewerton Schwab Pinto Junior: “Como é de conhecimento público e notório, o rompimento da barragem de Mariana trouxe enormes prejuízos ao meio ambiente, assim como para as pessoas atingidas pelos efeitos devastadores dos rejeitos de minério em contato com a natureza, fato este que as torna, a meu ver, consumidores por equiparação*, nos termos do artigo 17, do Código de Defesa do Consumidor, in verbis: Art. 17. Para os efeitos desta Seção, equiparam-se aos consumidores todas as vítimas do evento.”
Consumidor por equiparação
Além dos consumidores ordinários, que são todas as pessoas físicas ou jurídicsa que adquirem ou utilizam produto ou serviço como destinatário final, o Código de Defesa do Consumidor (CDC) confere proteção jurídica similar às vítimas de acidentes de consumo.
O Defensor Público Rafael Portella explica a equiparação com um exemplo de um caso em que um pedestre é atropelado por um ônibus. “Embora não tenha contratado o serviço de transporte, ele foi vítima de um acidente de consumo e portanto faz jus à proteção diferenciada do CDC”.
“Nos mesmos moldes, milhares de indivíduos foram atingidos pelos rejeitos advindos do rompimento da barragem de Fundão, Mariana/MG. Famílias perderam suas casas, terras, sua subsistência e modo de vida em virtude de um acidente relacionado à atividade fim das empresas envolvidas. Diante da magnitude das consequências que acidentes de consumo podem gerar na sociedade, a lei garante a referida equiparação”, completa Portella.
Direitos do consumidor por equiparação
Segundo Rafael Portella diversos reflexos jurídicos são gerados com a aplicação do Código de Defesa do Consumidor na defesa dos atingidos pelo desastre ambiental.
“Podem ser ressaltados: a incidência da responsabilidade objetiva (ou seja, não há análise da culpa como requisito para caracterização da responsabilidade), a inversão do ônus da prova (isto é, pode o juiz determinar que a empresa que produza as provas de difícil comprovação pelo atingido, em virtude de sua vulnerabilidade fática), a aplicação do prazo prescricional de 05 anos para o ajuizamento de demandas que discutam os reflexos do acidente de consumo, dentre outros”, explica o Defensor Público.
Ele ressalta que o atingido pelo desastre ambiental de Mariana é um consumidor por equiparação e que se trata de um importante precedente, que acata tese defendida pela Defensoria Pública.
“Embora ainda não haja legislação nacional específica para salvaguardar os direitos dos atingidos por barragens, a legislação prevê em diversos diplomas direitos e garantias especiais que, juntos, compõem um mosaico de direitos dos atingidos. A Constituição, o Código de Defesa do Consumidor e a legislação ambiental, dentre outros, preveem mecanismos para facilitar o acesso à Justiça e permitir a justa reparação aos atingidos”, aponta Portella.
Por Raquel de Pinho