DPES contribui para alteração de precedente sedimentado há cerca de 18 anos no STJ sobre unificação de penas

Após 1258 recursos e cerca de 600 pedidos de habeas corpus elaborados pela Defensoria Pública do Espírito Santo (DPES), o Superior Tribunal de Justiça (STJ) finalizou julgamento, no último dia 22 de fevereiro, sinalizando alteração do entendimento seguido há cerca de 18 anos nos tribunais superiores.

A coordenadora de Execução Penal da DPES, Roberta Ferraz, lembra que há quase vinte anos entendia-se que a progressão deveria ser calculada a partir da data do último trânsito em julgado, o que resulta no prolongamento da prisão. Portanto, o tempo de pena cumprido pelos condenados até a data em que a condenação se tornou definitiva não era computado para fins de progressão de regime.

Já no Espírito Santo, “até metade de 2014, a fixação da data-base era feita na data do último crime praticado ou da última prisão, pois essa era a última conduta cuja responsabilidade se atribuía à pessoa condenada. Esse sempre foi o sustentado pela Defensoria Pública”, explica a Defensora. No entanto, a partir do segundo semestre daquele ano, o judiciário do estado passou a adotar a tese dos tribunais superiores.

Com a unificação de penas e alteração da data-base na sentença condenatória ou no trânsito em julgado, várias pessoas condenadas tiveram seu direito de progressão de regime postergado. Dessa forma a pessoa condenada estaria sendo prejudicada pela demora da tramitação dos processos e por fazer uso do seu direito de ampla defesa.

“Com isso houve impacto considerável no período de pena pelo qual a pessoa teria que ficar presa e, consequentemente, na superlotação carcerária”, conclui Dra. Roberta. Segundo a coordenadora o custo aproximado de cada preso para o estado do ES é de 3 mil reais.

De acordo com o Defensor Público Claudiner Rezende, que atua no Núcleo dos Tribunais, a decisão traz benefícios para o estado e para a sociedade espírito santense. “Em termos financeiros, não se permite que se gaste com quem não deveria estar no sistema e, a partir do momento que se aplica um sistema de pena justo, a sociedade vê que o sistema de justiça está funcionando”.

ATUAÇÃO DA DPES

A partir do segundo semestre de 2014, quando houve a mudança de entendimento do judiciário no ES, os Defensores Públicos do Núcleo de Tribunais impetraram habeas corpus aos Tribunais Superiores no intuito de provocar a rediscussão da matéria.

Mesmo ciente do posicionamento sedimentado, o Núcleo de Tribunais Superiores, com atuação em Brasília, articulou-se com representantes de diversas Defensorias Públicas Estaduais para levar ao conhecimento dos Ministros a repercussão e a injustiça da manutenção de tal posicionamento.

Segundo o Defensor Público do Núcleo dos Tribunais Superiores, Thiago Piloni, em muitas das diligências foi possível esclarecer a tese provocada, apresentando dados estatísticos, argumentos de política criminal, bem como noticiando as constantes injustiças provocadas pela forma de cálculo hoje superada.

A DPES, por meio do Núcleo de Execução Penal e do Núcleo dos Tribunais, cumpriu seu compromisso e passou a provocar a matéria perante os juízos de execução, Tribunal de Justiça e, consequentemente, Superior Tribunal de Justiça. Piloni ressalta que foram inúmeros agravos em execução, habeas corpus, recursos ordinários, agravos em recursos especiais e recursos especiais.

“O mesmo ocorreu com as demais Defensorias de todo o país. Essa postura estratégica motivou a rediscussão da tese pelos Ministros do STJ, que culminou em um julgamento conjunto histórico de um habeas corpus da Defensoria Pública de MG e de um recurso especial da Defensoria pública de SC, ocorrido na Terceira Seção do STJ”, explicou Piloni.

Além da atuação judicial, a Defensoria Pública participou de reuniões junto a representantes dos Poderes Judiciários e Executivo, para alertar quanto à repercussão que a fixação da data-base no último trânsito em julgado poderia ter no sistema prisional.

“Diante de uma evidente injustiça, é papel da Defensoria Pública, como instrumento do regime democrático, dar voz aos vulneráveis, e, exercendo um viés contramajoritário, demonstrar o desacerto da posição dominante. Mesmo que isso se concretize apenas após uma longa batalha e à custa de cerca de 1000 respostas negativas”, declara o Defensor Púbico Daniel Reis.

IMPACTOS DA DECISÃO

A nova jurisprudência já vem sendo adotada. Um dos primeiros casos, em que a decisão foi favorável à tese adotada pela DPES, aconteceu na última sexta-feira (02). Trata-se de um habeas corpus impetrado pela DPES junto ao STJ, ocasião em que a Ministra Maria Thereza de Assis Moura concedeu a ordem monocraticamente para fixar a data-base na última prisão.

Acesse esta decisão

“A não acomodação da Defensoria Pública do Espírito Santo foi fundamental para reverter esse posicionamento que vinha sendo adotado há anos. Só com atuação cooperativa de defensores públicos de diversas instâncias foi possível vislumbrar uma mudança, assim como aconteceu no reconhecimento da inconstitucionalidade do regime integralmente fechado”, sustenta Roberta.

 Por Raquel de Pinho e Leandro Neves